Novos problemas, velhas questões, novos impactos.
O que a pandemia do Covid-19 e seus desdobramentos têm imposto às mulheres?
Publicado: 16 Abril, 2020 - 12h16 | Última modificação: 16 Abril, 2020 - 12h31
Escrito por: Secretaria de Mulheres e Secretaria de Combate ao Racismo
Isolar-se. Para grupos privilegiados, essa ação pode ser facilmente realizada sem maiores consequências, funcionando até mesmo como uma espécie de retiro dos males do mundo. Mas o que dizer quando os males do mundo estão em nossas casas, mulheres? A desigualdade dá as caras em nossos cômodos, ou apenas em um cômodo, para muitas. Na injusta e exaustiva divisão das tarefas domésticas, a dupla jornada volta-se em tempo integral para o interior dos lares. Isso claro, para aquelas que puderam permanecer em casa sem ter seus direitos e rendimentos eliminados.
O que dizer das mulheres não confinadas? Da grande base de nossa pirâmide social que precisa sair para trabalhar durante a pandemia? O que fazer em relação à tantas mulheres, em sua maioria negras, autônomas, ambulantes, faxineiras e a muitas outras categorias invisibilizadas?
Para muitas dessas categorias, ter de encarar o “isolamento” significa simplesmente encontrar-se ameaçada perante outro mal do mundo, a violência, que em um cenário de graves limitações econômicas, tende a tornar-se cada vez maior.
Os dados estão postos, as nações unidas já relatam ampla subnotificação de agressões às mulheres e o aumento da procura por abrigos de proteção. Para além das paredes do “lar”, as ameaças externas ao sustento das famílias nos atinge igualmente, nesse caso, sem distinções. Na socialização de prejuízos, finalmente somos iguais, tristes, revoltadas e subjulgadas.
A atenção dada pela mídia aos novos problemas causados pela disseminação do vírus resume-se aos seus impactos econômicos, como se já não sofressemos isso na pele diariamente. Quem falará da nossa saúde? Da nossa integridade física? Um direito tão elementar que está mais ameaçado do que nunca. Com o agravante das sombras da reclusão, como pedir por socorro? Sem as relações extradomiciliares que para muitas operavam como uma válvula de escape do tenso ambiente doméstico, o velho desafio de torná-lo menos espinhoso e ameaçador bate a porta novamente.
Como respostas de enfrentamento a esses fatos, muitas iniciativas têm sido tomadas, como por exemplo, a criação de um mapa de acolhimento para as vítimas da violência de gênero através do movimento virtual #tocomelas junto ao canal de atendimento 180. Ainda assim, imaginemos a dificuldade de se realizar uma denúncia estando confinada com quem oprime por vezes a nós, por vezes a nossas irmãs. Solidariedade! É preciso criar, ampliar as redes! Perguntar! Escutar! Em casa ou nas ruas, observar, denunciar. Nesse momento onde tantas crises voltam a atormentar mulheres de diversas classes e camadas sociais, precisamos nos olhar sabendo que não estamos sós, e que juntas, como a história nos provou inúmeras vezes, poderemos agora, senão vencer o retorno ainda mais forte de velhos problemas, apaziguá-los! Para tornarmos o isolamento daquelas que não poderiam jamais estar isoladas - uma vez que estão submetidas diariamente ao risco ou a efetiva violência doméstica - algo minimamente próximo àquele privilégio de quem pode retirar-se dos males do mundo no seu próprio lar.
Lucivaldina Brito
Secretária de Mulheres CUT-Ba
Gilene Pinheiro
Secretária de Combate ao Racismo CUT-Ba